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Para onde estamos indo, mesmo?

foto Vicky blochVICKY BLOCH (FOTO: REGIS FILHO)
Imagine um avião lotado, comandado por um piloto que não lembra mais o destino de pouso nem fala o idioma da tripulação. É esse cenário que a consultora Vicky Bloch diz encontrar em várias empresas. Há mais de 35 anos ela ajuda altos executivos a refletir sobre as motivações no trabalho, ajudando-os a melhorar a performance por meio do autoconhecimento. O problema atual é que a falta de propósito se alastrou feito uma epidemia em todos os níveis de uma organização.
Hoje em dia se fala muito em escassez de talentos no Brasil. O que falta para os líderes locais? O que falta é um sentido no trabalho. As pessoas estão infelizes. A gente perdeu a relação com a missão, com a causa do que estamos fazendo. Nos primórdios das cavernas, trabalhar significava resolver as necessidades da sociedade. Um cuidava de matar, outro de cozinhar, e a satisfação me parece que tinha a ver com você ter um papel nesse processo. Mesmo na industrialização, quando tinha um capataz que dizia o que você devia fazer, o trabalho resultava em um produto, como um carro, que é um meio de locomoção. Acho que as pessoas se viam realizadas. Hoje, principalmente quando se fala de liderança, não tem mais uma causa. Perdeu-se essa relação de troca com a sociedade. Não é o talento que está escasso. As pessoas não emburreceram. O que elas não têm mais é um vínculo que faz com que entreguem um trabalho diferenciado.
Qual a origem dessa infelicidade e falta de sentido? Do ponto de vista macro, é o sistema, que exige que você entregue resultados a qualquer custo. Esse qualquer custo acaba se refletindo nas relações com a equipe. Você não vai mais para o trabalho com prazer, para resolver uma equação que tem a ver com a melhoria da sociedade. A relação com seus subordinados é permeada por esse jeito de não gostar do trabalho que faço.
Então o problema de relacionamento com a equipe é a principal consequência dessa falta de vínculo com o trabalho? Acho que sim. Muitos gestores são encaminhados para treinamento por causa disso. Muitas vezes a pessoa ainda não sabe orientar, só comandar. Eu pergunto: ‘Você gosta do que faz? Está fazendo isso por quê?’. A dificuldade em responder é enorme. ‘Faço isso porque sou gerente.’ ‘Não, não é isso que estou perguntando. Quero saber se trabalho para você é uma coisa bacana?’ Tento ver se ele tem clareza de causa e missão. E poucos têm isso. Hoje, as empresas promovem pessoas de 30 anos para cargos de diretoria sem avaliar se estão preparadas. Não se pode promover apenas por uma questão técnica. É preciso avaliar a maturidade pessoal.
O que os gestores deveriam fazer diferente? Quando você fica responsável por outras pessoas, é uma opção de cidadania, não de trabalho. Está falando para o funcionário de sua equipe que vai cuidar dele. Para isso, deve aprender a falar e a ouvir. Mas com 30 anos, muitas vezes, o cara não sabe conversar abertamente nem com a mulher dele, como vai fazer diferente no ambiente profissional? Ouvir não significa apenas escutar o que a pessoa está falando. Mas prestar atenção em sua expressão física, o olhar… A relação com os subordinados é a zona de liberdade do gestor. A empresa não diz como você tem de fazer. É ali que o líder pode fazer a diferença – para o bem, ajudando a crescer, ou para o mal, bloqueando o crescimento.
Se o significado do trabalho não está claro, o que motiva os profissionais hoje? O pensamento de que têm de fazer, ou têm de ser pessoas bem-sucedidas. Aí o funcionário vai subindo na organização e o que leva para casa é a grana e o status. Mas não leva o prazer, o orgulho de ser um médico, um professor ou um gestor.
O propósito não pode ser simplesmente ganhar dinheiro? Sim, é legítimo. A medida é: está feliz? É o que importa.

Fonte:http://epocanegocios.globo.com/Informacao/Visao/noticia/2012/12/vicky-bloch.html